Desalento e esperança



Um novo ano chega, mais carregado ainda, em relação aos anos anteriores, de paradoxos e antíteses que, no campo da linguagem, são figuras que expressam palavras e ideias contraditórias ou opostas. O ano que agora recebemos tem em seu calendário a realização de eleições de prefeitos e vereadores, que são ainda mais próximas dos cidadãos. Bom mesmo que haja sempre o contraditório e que este seja sempre respeitado sem abrir mão da discordância. Desalento e Esperança sinalizam alguns dos sentimentos opostos que nos alcançam, enquanto brasileiros, neste momento especial de virada do calendário. E, se há o desalento, por um conjunto imenso de motivos, a esperança, até como antídoto, precisa estar presente também em conjunto. Mas, que não aquela esperança que leva à passividade do comodismo ou da aceitação que, muitas vezes, decorre de manipulação por interesses dos mais diversos. E sim a esperança que desafia, instiga, motiva para o movimento e que pode trazer a reversão do desalento.

Muitas são as frustrações. As notícias sobre o atual quadro econômico e, pior ainda, as previsões válidas pelo menos para os meses iniciais do novo ano, são desalentadoras. Queda do Produto Interno Bruto, o PIB, ou seja, a soma da riqueza produzida no País, a inflação em alta, o desemprego crescente. Há desalento forte também para muitos estudantes que apostaram no Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), programa do Ministério da Educação que financia cursos superiores não gratuitos ou daqueles que contaram com ele para formação profissional com o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego, o Pronatec. Programas reduzidos pelo governo federal e muitas expectativas frustradas. A lamentável falta de diálogo verificada na chamada reorganização escolar do governo estadual de São Paulo. Desalentador é também o caótico quadro da saúde pública brasileira. Triste ver o contínuo painel de pessoas sem atendimento, na espera em macas dos corredores de hospitais sem recursos até mesmo de medicamentos básicos com profissionais sem receber salários. Muitas dificuldades também na precária segurança pública e na violência que nos choca diariamente. E no fechar do ano, uma triste notícia, o incêndio que destruiu o Museu da Língua Portuguesa, um patrimônio cultural ímpar de São Paulo e do País, em especial por estudantes que ali de forma lúdica e dinâmica tinham aprendizado, difícil de acontecer sem aquele espaço. Desalentos que não se esgotam nas citações aqui enumeradas.

E o contraponto só pode ser Esperança, cuja lista também precisa ser imensa. Mesmo em paradoxos e antíteses. Então, no plano da esperança política, que as eleições municipais possam garantir a manutenção daquilo que vem dando certo e promovam efetivas alterações de rumo para aquilo que precisa mudar, para que a sociedade tenha seus legítimos anseios e direitos atendidos. Que o País saia do impasse em que se meteu e volte a gerar crescimento e oportunidades, superando as crônicas mazelas sociais. Que haja cada vez mais ingressos também de alunos de escolas públicas nas nossas boas universidades, inclusive nas disputadas universidades públicas. Que os Conselhos de Escola e as instâncias colegiadas das escolas, em nosso estado e em todas as unidades da federação, participem efetivamente de decisões que produzirão efeitos de impacto. Que haja de fato apoio para a educação, para as escolas públicas, e reconhecimento aos que tornam concreto um importante aspecto de desenvolvimento humano, a educação. Que o Fies volte a cumprir de forma mais abrangente seu papel apoiador. Que o Pronatec retome suas metas trazendo formação e capacitação profissional. Que a saúde pública deixe de ser abordada apenas por lamentáveis situações críticas, verdadeiros absurdos e descalabros, os mesmos mostrados há muito tempo. Que haja segurança para efetiva proteção da população. Que o Museu da Língua Portuguesa seja rapidamente recuperado, voltando a ser o espaço educacional e cultural relevantemente necessário.

Enfim, um novo ano chega carregado de desalento, mas também de esperança. A esperada mudança para melhor não se produzirá por automatismo de virada do calendário. Que ao fim do ano que agora se inicia possamos ter ido, individual e coletivamente, além do desalento e da esperança.

Artigo publicado no jornal Correio Popular - Campinas - 05/01/2016

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