A perenidade do sonho



Há 50 anos, o líder pacifista,também pastor da igreja Batista, Martin Luther King Jr., proferiu um discurso, em meio a uma concentração de milhares de cidadãos estadunidenses, que ficaria na história. A parte mais emblemática do célebre discurso, “eu tenho um sonho”, circunscreve-se no conjunto das frases mais significativas e reproduzidas do século XX. É sempre referência na luta, que está longe de terminar, pela igualdade racial e social. Que deveria ser natural, mas que, lamentavelmente, não se evidencia em muitas situações da existência humana.

Luther King tornou-se um dos mais importantes líderes da luta pelos direitos civis no mundo, com a campanha pacifista e de solidariedade humana. O pastor liderou em 1955 o boicote aos ônibus de Montgomery, movimento em apoio à sra. Rosa Parks que, retornando para casa depois de um estafante dia de trabalho, negou-se a ceder seu lugar em um ônibus e, pasme-se, foi presa por descumprir uma lei estúpida e absurda. Nesse contexto, corajoso e necessário, Martin contribuiu decisivamente em 1957 com a fundação da chamada Conferência da Liderança Cristã do Sul do seu pais, região de forte embate racial. Foi o primeiro presidente da referida Conferência, fatos que iam consolidando uma liderança ainda ímpar. Tais fatos, acompanhados de sucessivos movimentos coletivos, levaram, em 1963, à Marcha sobre Washington, palco para o famoso discurso do “I Have a Dream”, de grande impacto dentro e fora do território norte-americano. Discurso que transformava um desafio particular, o de ver seus quatro filhos, então pequenos, crescerem em um país de plena igualdade racial, em uma expressão de intensa representatividade coletiva. Sonho de muitos pais, mundo afora, no século passado e também ainda desafiador nesta segunda década de um novo século.

Assim, um reconhecimento da importância e do alcance da luta desse memorável pastor, em outubro de 1964, King recebeu reconhecimento de dimensão mundial com o Prêmio Nobel da Paz, pelo combate à desigualdade racial, pautada em expressões da não violência. Nos anos seguintes, que antecederiam a seu assassinato, houve expansão dos temas de luta, estabelecendo foco também contra a pobreza, que marca a desigualdade social e racial. Também pautou ação contra a trágica Guerra do Vietnã, com outro discurso corajoso, em 1967, intitulado “Além do Vietnã”.

Obviamente essas ações contrariavam interesses e ideias opostas. Martin Luther King era odiado por muitos segregacionistas do sul dos Estados Unidos e também pelos defensores dos interesses bélicos. King foi brutalmente assassinado em abril de 1968, estando sua mulher grávida. Sua luta, assumida por muitos, teve e tem continuidade, demonstração de que sua marca não cristalizou personalismos, desses que acabam quando o líder passa. Ele também recebeu postumamente expressivas láureas, tais como a Medalha Presidencial da Liberdade, em 1977, e a Medalha de Ouro do Congresso norte-americano, em 2004. O Dia de Martin Luther king Jr. foi estabelecido como um feriado federal dos Estados Unidos, em 1986. A data é celebrada sempre na terceira segunda-feira do mês de janeiro, por ser data próxima ao aniversário de King. Foi a partir de 1993 que esse feriado foi cumprido em todos os estados do país.

Cinco décadas se passaram e a luta a luta do saudoso pastor continua. O filho do reverendo, Martin Luther King III, também ativista pelos direitos civis, pediu que a luta iniciada há 50 anos prossiga. Disse ele, com muita razão, que “não pode haver um passo atrás" na busca dos direitos, pois, segundo King III, o sonho expresso há 50 anos ainda não foi realizado.

Em tempos de pregações religiosas distorcidas, que priorizam a prosperidade material pessoal como finalidade relevante, e assim estabelecem relação comercial no sagrado campo da fé, com objetivo da chamada benção financeira, necessário se faz resgatar e fortalecer o princípio de buscar a transformação de toda a sociedade, a começar pela justa universalidade do direito a uma vida digna através de uma ação coletiva baseada em princípios de uma fé consciente, que promova efetiva inclusão de todos. Em tempos que parte da chamada bancada evangélica, em várias instâncias da nossa política, adota comportamentos que negam tais princípios e causam muitos constrangimentos, o discurso e a luta de um pastor, Martin Luther King Jr., precisam ser relembrados, resgatados e praticados.

Artigo publicado no jornal Correio Popular - Campinas - 24/12/2013
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