SEGURANÇA - Não à reducão da maioridade

Por André Luis Pires de Souza - teólogo, pastor titular da Igreja Metodista Central de
Campinas (prandresouza@hotmail.com); e Edison Cardoso Lins, educador, mestre em Educação

A Comissão de Constituição de Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, infelizmente, aprovou a proposta que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos de idade. Mas o debate precisa ser ampliado. Afinal, a Câmara criará comissão especial para analisar a Proposta de Emenda Constitucional (PEC). Só depois de ser votada duas vezes no Plenário da Câmara e de passar pelo Senado, também em dois turnos, é que a proposta poderá virar lei. A tramitação da PEC poderá ainda ser questionada no Supremo Tribunal Federal (STF).

A situação de violência em nosso País assusta a população. Portanto, é justo o clamor popular para medidas de reversão desse quadro terrível. Algumas propostas camuflam tais fatores. A que defende a redução da maioridade penal é uma. Trata-se de uma medida que poderá ampliar a exclusão social e os seus danosos impactos e que, de fato, poderá não trazer a solução que a população espera. Familiares de vítimas dos crimes, incluindo aqueles cometidos por menores, querem justiça. Na tentativa de responder a isso há propostas de eficácia duvidosa. E com o risco de abrir caminhos que acentuem o quadro de injustiça social, uma infeliz marca do nosso País. Os números indicam que reduzir a maioridade penal está longe de ser solução. Segundo a Unicef, o Fundo das Nações Unidas para a Infância, da ONU, dos 21 milhões de adolescentes brasileiros, apenas 0,013% cometeu atos contra a vida. Do total de homicídios cometidos no Brasil nos últimos 20 anos, apenas 3% foram realizados por adolescentes. O número é ainda menor em 2013, quando apenas 0,5% dos homicídios foram causados por menores. São os jovens de 15 a 29 anos as maiores vítimas da violência. Em 2012, entre os 56 mil homicídios ocorridos no Brasil, 30 mil eram jovens, sobretudo negros e pobres.

A participação dos adolescentes, no total da criminalidade, não comprova que a redução da maioridade penal contribuirá para a redução da criminalidade. Especificando um pouco, pode-se verificar que o número de adolescentes internados na Fundação Casa  Centro de Atendimento Socioeducativo aos Adolescentes  do Estado de São Paulo, por assassinato ou latrocínio são menos de 1,5%. Nesse contexto, outro equívoco são as manifestações contra o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990, que estabelece o direito à cidadania, para adolescentes conforme a Constituição Federal de 1988, entendendo equivocadamente que o estatuto protegeria menores infratores. O mesmo foi criado para proteger menores de 18 anos de comportamentos gravíssimos cometidos por adultos. Violência física, negligência e abuso sexual estão entre as atitudes que fazem do tal estatuto uma arma cidadã para os adolescentes. O ECA também prevê reparações de erros, trabalho comunitário, tratamento e privação de liberdade para os adolescentes em conflito com a lei. É preciso que haja recursos adequados e profissionais preparados para que as medidas socioeducativas tenham efetivo cumprimento e efeito prático.

Há ainda um longo caminho a ser percorrido e que precede a defesa da ampliação da maioridade penal. É também preciso conhecer o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, um conjunto de princípios e normas para a execução das medidas socioeducativas, por resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), Lei Federal 12.594, sancionada em 2012.

Então, uma pergunta se faz inevitável: colocar, isoladamente, esse contingente na cadeia, resolverá de forma efetiva a terrível e crônica criminalidade brasileira? E a sociedade, que papel deve ter? Há uma antiga, e sábia, exemplificação ensinando que por vezes olhamos para os outros e não retiramos o cisco que está em nossos próprios olhos. Ao defender a redução da maioridade penal pode-se não estar olhando para a indiferença social com que agimos para a falta de solidariedade, para a ostentação consumista que, por ação ou omissão, cometemos. Fatores que ampliam a desigualdade social e a falta de outros valores que poderiam indicar orientação de outra ordem para os adolescentes. É hipocrisia propor maior punição aos jovens, desconsiderando o descaso da sociedade. Que se expressa em não exigir que se cumpra leis já existentes, com as condições previstas, ou sem mobilizar-se contra o fechamento de salas de aula, sem ir contra a diminuição da oferta do ensino público noturno de qualidade, fundamental para os jovens que precisam trabalhar durante o dia. Que as linhas de ação para inclusão social, educacional e profissional dos jovens aconteçam de forma ampla. Sem o que, reduzir a maioridade penal é panaceia falaciosa.


Artigo publicado no jornal Correio Popular - Campinas - 04/04/2015
SEGURANÇA - Não à reducão da maioridade SEGURANÇA -  Não à reducão da maioridade Reviewed by Edison Lins on 06:18 Rating: 5
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